E, em tempos de crise, em que a pressão se acentua com a redução do crédito e dos pedidos, além da falta de recursos ou de perspectivas, que ameaçam a nossa estabilidade, há um aumento exponencial destes momentos de conflito.
Se nós pudéssemos visualizar fisicamente os desacordos, eu os descreveria como uma poeira ou sujeira que causa do atrito entre as engrenagens de um “sistema” enorme e complexo, que representa o nosso dia-a-dia. Esta poeira emperra as engrenagens e impede o funcionamento deste “sistema”.
Como podemos resolver esta situação permitindo que as engrenagens voltem a funcionar sem atrito? Por intermédio da negociação.
A negociação, neste caso, seria um óleo lubrificante que eliminaria a sujeira entre as engrenagens, permitindo que o “sistema” funcione adequada e suavemente. E, passando por momento de crise ou não, negociamos o tempo todo, porque existem conflitos que persistem sem dependerem de momentos especiais.
É verdade, nós negociamos quase que o tempo todo. Eu costumo dizer que já acordamos negociando: com o nosso despertador, com a família (esposa, marido, filhos), com o zelador, no transito, no trabalho... E se enfrentamos uma situação de crise, o ambiente torna-se ainda mais tenso. E, por quê?
Porque não estamos negociando com eficiência e eficácia. Nós atuamos de forma intuitiva e espontânea. Poucas pessoas tiveram a oportunidade de estudar e de treinar na arte de negociar. Por isso, em geral, não obtemos bons resultados.
A negociação é um processo e, como todo processo, ela pode ser estudada e praticada com o intuito de melhorar nossa produtividade. Deixando a teoria de lado e passando para a prática, quero apresentar algumas “dicas” de como podemos negociar melhor e, principalmente, em momentos de crise, por exemplo.
Imagine que você tenha um cliente que compra 80% de toda sua produção fabril. Trata-se do seu maior cliente e, também, do seu maior problema, pois em toda negociação de novas condições comerciais, este cliente, sabendo de sua importância, vai pressionar ao máximo para obter vantagens nas negociações, o que consequentemente diminui seus resultados. Num momento de crise, uma negociação como essa com este suposto principal cliente é um fator que apavora qualquer um. Neste caso, o que fazer para obter um resultado que não onere seus negócios? Lembrando que a negociação é um processo, é preciso estar atento a cinco pontos: objetivos, estratégia, informações, time e concessões.
Analisando a situação, um primeiro passo é criar vários cenários com a carteira de clientes desta fábrica, inclusive um em que não contivesse este grande cliente. De início pode ser absurdo, mas é muito importante que seja estabelecido um “limite máximo” para ceder, pois às vezes é mais vantajoso trabalhar com 20% da produção atual e obter um lucro razoável do que trabalhar com uma produção cinco vezes maior numa situação estressante e com um lucro mínimo ou até com prejuízo.
A orientação neste caso é fazer vários exercícios para se ter uma visão clara do que o cliente quer e até onde é possível negociar para continuar atendendo este grande cliente. Tendo estas informações de maneira clara, no momento de uma árdua negociação, você pode chegar a um nível de argumentação que pode reverter o jogo. Como? Apresentando a este cliente que, nessas condições impostas por ele, é preferível encerrar a negociação e diminuir de tamanho da operação. Afinal de contas, reduzir o porte de uma empresa é mais vantajoso que trabalhar com prejuízo.
Certamente, a negociação será revista e haverá um consenso para que se consagre um negócio que seja interessante para ambas as partes. Moral da história: nunca entre numa negociação se não tiver “limite máximo” definido, ou seja, é preciso conhecer o seu ponto de saída.
Uma outra situação muito freqüente num conflito é saber dizer “não”. Realmente o “não” pode criar uma condição de impasse, aumentando a tensão a ponto de levar a outra parte a mudar para uma postura agressiva e, normalmente, negociações agressivas dificilmente levarão a um relacionamento sustentável e de longo prazo. Então, como é possível dizer “não” sem falar o “não”? Resposta: coloque um preço no pedido.
Esta atitude pode ser bem ilustrada numa situação em que envolva a relação entre empregador e empregado. Imagine que em um dado momento, o colaborador, sempre muito prestativo, peça ao seu chefe que o autorize sair meia hora mais cedo para uma consulta médica. Diante de um profissional que sempre correspondeu às demandas da empresa, o chefe não nega o pedido ao seu subordinado.
Duas semanas mais tarde, o colaborador novamente pede ao chefe para permitir que ele chegue uma hora mais tarde porque precisará receber no aeroporto um parente, que é muito querido, e está vindo pela primeira vez ao Brasil. Novamente, o chefe permite o atraso e, daí em diante, pedidos semelhantes a estes passam a ocorrer todas as semanas. Num dado momento, o chefe perde o controle e, por se sentir onerado diante do abuso, decide demitir o colaborador.
Neste caso, quem errou e acabou gerando uma situação em que ambas as partes se prejudicaram, ora porque o subordinado perdeu seu emprego, ora porque o chefe precisou abrir mão de um bom colaborador? Resposta: o chefe. Se, logo na primeira vez, o pedido tivesse sido aceito mediante uma compensação, certamente o subordinado saberia que para uma concessão haveria um custo a pagar. Moral deste outro exemplo: para dizer “não” sem falar “não”, basta colocar um preço no pedido. E, para pedidos exagerados ou indesejados, coloque um preço equivalente.
O objetivo pelo qual foi dado esses exemplos é para alertar que, em todas as negociações que nos deparamos, se forem aplicadas técnicas adequadas, certamente haverá o aumento da eficiência do negociador. Assim, o ato de negociar pode ir sempre melhorando e o negociado adquire a habilidade de diminuir o número e a intensidade dos conflitos. Resumindo: a partir do domínio da arte de negociar, que é possível através da absorção de técnicas, diminuímos os conflitos e, consequentemente, possibilitamos a melhoria da qualidade de nossas vidas.
Autor: José Roberto Ribeiro do Valle, sócio-diretor da Scotwork do Brasil.
Via: B2B Magazine
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