Se você acompanha os posts do Oficina sobre Bitcoin sabe que o mercado anda aquecido, ou melhor, anda pegando fogo. Hoje, dia 6 de dezembro, 1 moeda virtual está sendo cotada em mais de 16 mil dólares, um recorde. Feliz de quem comprou quando ela valia centavos ou alguns poucos dólares.
Mas o objetivo deste post aqui não é explicar como o Bitcoin é gerado ou como ele chegou a custar o valor que está hoje (para isso confira os posts no box ao lado). O objetivo deste texto é falar dos efeitos colaterais nem um pouco convencionais que ele tem causado, como o aumento do consumo de energia.
Sim. De acordo com o site Digiconomist, especializado em moedas virtuais, a rede Bitcoin, também chamada de Blockchain, está consumindo energia a uma taxa anual de 32 TeraWatts hora, ou seja, 32 mil GigaWatts hora, ou numa escala ainda mais reduzida: 32 MILHÕES de Megawatts hora. Para você ter noção do que isso significa, a hidrelétrica brasileira de Itaipu (maior geradora de energia renovável do mundo) produz "apenas" 14 mil Megawatts hora.
Sacou o tamanho do problema? Se não sacou, aqui vai uma imagem ilustrativa do que está acontecendo nesse momento:
Hoje a produção de Bitcoin está consumindo tanta energia quanto a Dinamarca, país de quase 6 milhões de habitantes. De acordo com os cálculos do site, cada transação completa de Bitcoin consome 250kWh para ser gerada (para saber mais sobre como funcionam as transações e o que a diferencia da mineração em si veja nosso post completo sobre a moeda), o suficiente para alimentar uma casa por nove dias na média.
O mais assustador contdo é como esse crescimento está se dando. Em novembro eram 25 Twh, 1 mês depois já era os citados 32 TWh: um crescimento de 24%.
Naturalmente, isso está levando a sérias preocupações com a sustentabilidade do mercado de moedas virtuais (além da sustentabilidade do próprio planeta). Eric Holthaus projeta que se for mantida esta taxa de crescimento, no início de 2020 a rede Bitcoin "usará o equivalente a toda eletricidade disponível em 2017 no mundo". "Esta é uma trajetória insustentável", ele escreve.
O que fazer então? A produção de energia global, obviamente, não pode duplicar em dois anos, e, caso conseguisse, seria um desastre ambiental impensável. A parte boa para nós e para a sustentabilidade é que a mineração não vai durar para sempre, pois a moeda tem um número FINITO de unidades que fora definido por Satoshi, seu criador, e não pode ser alterado.
Ou seja, depois que todos os bitcoins forem minerados, somente ocorrerão transações e nenhuma nova moeda surgirá. A partir de então a Blockchain irá consomir energia apenas através das transações qie, por sua vez, demandam uma quantidade ridícula de energia se comparadas ao custo de minerar 1 moedinha sequer.
Num futuro próximo, as transações serão o único gasto que o mercado virtual irá impor. Assim o consumo de energia é projetado para cair no longo prazo e os otimistas do câmbio virtual apontam justamente este fato para alegar que a previsão de Holthaus é demasiada alarmista.
Gastos com energia hoje
Quanto aos valores exclusivos gastos com a mineração Bitcoin não se sabe exatamente a energia consumida devido ao caráter secreto da coisa. No entanto, podemos fazer algumas hipóteses, ou melhor, o Digiconomist pode: Para começar, sabemos as receitas da indústria: os mineradores geram atualmente 75 bitcoins por hora ao redor do mundo, o que, no preço atual de cerca de US$ 16.200 por bitcoin, se traduz em US$ 1.215 milhão por hora, ou mais de US$ 10.6 bilhões por ano (lembrando que o valor do BTC muda vertiginosamente a cada semana e essa previsão é bastente pontual e temporal).
Detalhe: Após gerada a moeda, 60% de ser valor será utilizado apenas para pagar gastos em energia.
Com esses números em mente não podemos esquecer que a cada nova elevação no preço dos bitcoins há um aumento igualmente proporcional do consumo dos mineiradores que também aumentam sua produção ativando hardwares menos eficientes ou adicionando mais máquinas à sua rede para que possam aproveitar o mercado aquecido e obter um lucro ainda maior. Já se o preço do BTC cair significativamente, por outro lado, os mineiradores encontrarão suas operações não lucrativas e começarão a desligar seus equipamentos menos eficientes. Nesse fluxo consumo de energia aumenta ou diminui, respectivamente.
Assim o mesmo Digiconomist continua com as estimativas: Se o Bitcoin avaliado em US$ 12.500 gera um consumo equivalente a menos de 1% da energia que a economia dos EUA utiliza, baseando-se na relação preço de comercialização x aumento nos gastos com mineração, para que o consumo de energia de Bitcoin crescesse ao ponto de exceder somente o consumo americano (e não o do mundo todo, como previsto alguns parágrafos acima), o preço da unidade da moeda teria que subir aproximadamente 100 vezes e bater a casa do US$ 1 milhão.
Isso aconteceria antes de 2020? Não me parece provável. Claro que no início de 2015 o Bitcoin valia apenas US$ 200 por moeda, e quando ninguém esperava a moeda se fortaleceu e viu seu valor aumentar em 50 vezes nos últimos dois anos. Mas passar de 1 milhão? Muitos até concorodam que isso acontecerá com o tempo, mas não em menos de 3 anos.
Gastos com energia no longo prazo
Como todo assunto polêmico, o Bitcoin também conta com diversos equívocos e lendas ao seu redor. Um deles parte do princípio de que, como a mineração é baseada em um processo matemático, à medida em que mais e mais bitcoins fossem produzidos esse processo tornar-se-ia mais complexo e então aumentaria o consumo.
Mas na verdade esse é um engano. A rede Bitcoin foi projetada para ajustar-se automaticamente à dificuldade de mineração e com isso garantir que um bloco seja produzido a cada 10 minutos, não importando o poder total de processamento da blockchain.
Quando a Bitcoin lançou em 2009, cada bloco veio com uma recompensa de 50 BTCs para o mineirador que o validou. Este número está programado desde o seu lançamento para vir caindo pela metade a cada quatro anos. Caiu para 25 bitcoins em 2012 e 12,5 bitcoins em 2016. Essa recompensa fixa (e atual) de 12.5 bitcoins não depende do número de transações que a blockchain processa.
Seguindo o fluxo a recompensa cairá novamente para 6,25 bitcoins em 2020. E quando a receita da indústria de mineração cair pela metade novamente, nada mais lógico do que o seu consumo de energia destinado à produção caia na mesma proporção, afinal, se isso não acontecer a mineração irá constituir uma atividade não lucrativa.
Podemos reduzir o uso de energia da Bitcoin?
Embora o Bitcoin está longe de ser um desastre ambiental total, a Terra certamente seria um lugar mais verde se a rede Bitcoin não consumisse tantos recursos como consome hoje. Assim, algumas pessoas já elencam três jeitos pelos quais a operação das moedas virtuais poderia se tornar mais verde.
Jeito 1
Como já falado acima: Preço do Bitcoin despenca. Bem improvável de acontecer neste momento.
Jeito 2
Diminuir a recompensa de 12,5 bitcoins por bloco antes de 2020 como programado. Mas sabemos que, nesse caso, o discurso é mais fácil do que a prática. As empresas de mineração de Bitcoin não irão se dispor a isso voluntariamente, além do que aqueles que estão no Bitcoin desde o início também não vão aceitar as mudanças nas regras depois que o jogo começou.
E se você aposta que algum governo vá, talvez, entrar em ação e dar um jeito de baixar essa recompensa para impactar o consumo energético, creio que isso não seja possível. Para chegar a essa conclusão é só analisar um fato que já acontece há muito tempo na economia global: Se algum país tenta forçar uma mudança prejudicial às grandes corporações, as operações migram sem pensar 2 vezes para algum outro lugar que as convém.
Aconteceria isso com as mineradoras assim como aconteceu com grandes indústrias (fumageiras e confecções, por exemplo) ao saírem de países que, recentemente, impuseram maiores impostos indo estabelecer-se em outros locais.
Portanto, alterar o Bitcoin como um tudo iria precisar de um esforço regulatório global, o que não parece ser provável que aconteça tão cedo.
P.S. Lembrando que vivemos em um 2017 distópico onde o mundo convive e aceita que ainda possam existir países onde acontece a venda legalizada de escravos. Se a comunidade internacional não acaba nem com a escravidão institucionalizada, vai acabar com uma moeda virtual?
Jeito 3
Uma última opção seria reestruturar totalmente o processo de mineração Bitcoin, desde suas bases.
O algoritmo de mineração atual da Bitcoin é baseado na computação de um número impensável de funções de hash criptográficas e isso justifica o consumo de recursos da máquina e, consequentemente, da conta de luz.
Porém, outras criptografias têm explorado alternativas bastante viáveis. Bitcoin Gold, por exemplo, é uma variante recém criada do Bitcoin que usa um algoritmo de mineração "com memória". Segundo testes ele provou ser menos agressivo ao meio ambiente em relação ao consumo de energia. E esse é apenas 1 exemplo dentre tantos.
Mas da mesma forma que baixar a recompensa via intervenção governamental causaria protestos entre a comunidade, aqui ocorreria o mesmo. Tal passo não é impossível, mas parece improvável que aconteça em breve.
Resumindo. Até 2020 parece que o consumo tenderá somente a subir e é provável que o consumo de energia acompanhe na mesma proporção.
Para entender mais: Análise do consumo de energia do Bitcoin e sobre sustentabilidade e moeda virtual