Antes de você começar a ler este maravilhoso artigo, uma informação importante: Infelizmente ele não é de minha autoria, mas de Eric Berger, e foi publicado originalmente no site Ars Technica. Eu apenas tomei a liberdade de traduzi-lo para que mais pessoas possam ter a oportunidade de ler tal conteúdo.
A história foi dividida em 6 partes:
Parte 1 - Como um incêndio levou o homem à Lua
Parte 2 - A aposta de 50/50 que terminou com a vitória da Corrida Espacial
Parte 3 - O triunfo e a quase tragédia do primeiro pouso lunar
Parte 4 - A febre da Apollo segue viva na NASA
Parte 5 - Salvando a tripulação da Apollo 13
Parte 6 - Depois da Apollo, a NASA segue atrás de um bis
Agora sim, siga à leitura.
Enquanto o astronauta Fred Haise, da Apollo 13, flutuava no túnel que serpenteava entre o Módulo Lunar e o Módulo de Comando, ele ouviu - e sentiu - um forte estrondo. Ao redor dele, os dois veículos começavam a se contorcer. Então, as paredes de metal do túnel se enrugaram quando a espaçonave estremeceu.
De olhos arregalados, Haise correu do túnel para o módulo de comando ao lado de Jack Swigert e seu comandante, Jim Lovell. De sua posição costumeira à direita de Lovell, Haise avaliou rapidamente que algo estava muito errado com os tanques criogênicos da espaçonave - o oxigênio acabara de sumir. Felizmente, parece não ter havido uma explosão química, porque apenas uma parede fina separava o tanque de oxigênio dos tanques propulsores usados para alimentar o motor principal da espaçonave.
"Ele realmente não explodiu como você pensa que vai acontecer, com estilhaços", Haise disse em uma entrevista. "É apenas um caso de super pressurização, que então solta algum vapor. Se tivesse sido uma explosão do tipo estilhaços, eu não estaria aqui hoje".
O incidente ocorreu em 13 de abril de 1970, perto do final do segundo dia completo do voo Apollo 13. A tripulação a bordo da terceira missão da NASA na superfície da Lua acabara de completar uma transmissão de televisão ao vivo. Eles estavam cansados, mas também animados. Deveriam ir dormir logo e, quando acordassem, a espaçonave entraria na órbita lunar. Em cerca de um dia, Lovell e Haise estavam prestes a se tornar nada mais nada menos do que o quinto e sexto humanos a caminhar na superfície de outro mundo.
Mas agora, sentado no módulo de comando Odyssey, contemplando a perda de um tanque de oxigênio, o primeiro pensamento de Haise não foi acerca de qualquer perigo que a Apolo 13 pudesse enfrentar para voltar para casa. Imediatamente após o acidente, a morte não parecia tão iminente. Em vez disso, Haise só lamentava a oportunidade perdida de pôr os pés na Lua.
"Eu estava com dor no estômago de tanta decepção", lembrou Haise. "Eu sabia que tínhamos que abortar a missão e eu iria perder o pouso. Esse era o meu sentimento principal. Pensávamos que tínhamos um segundo tanque que estava intacto.
Mas o dano foi tal que o segundo tanque também foi afetado. Pode até ter vazado oxigênio mais devagar, mas o vazamento começou do mesmo jeito. Logo, a espaçonave perderia ambos os tanques de oxigênio. Isso não importava muito quem estava dentro do módulo de comando, pois os astronautas tinham o suficiente para respirar. Mas sem os tanques de oxigênio, a espaçonave não poderia operar suas células de combustível. A tripulação da Apollo 13 não teria como se mover. Eles enfrentaram a perspectiva de congelar até a morte no espaço sideral.
Quando os astronautas e controladores de voo da Mission Control perceberam que não podiam parar o vazamento no segundo tanque de oxigênio, a missão mudou de repente. A Apolo 13 não mais procuraria aterrissar na Lua. Sua missão havia se tornado de sobrevivência.
"Muitas chances"
Mesmo antes do acidente da Apollo 13, alguns diretores da NASA se perguntavam por quanto tempo poderiam escapar dos graves riscos de uma ida à Lua. Dados todos os diferentes aspectos de um voo lunar - do veículo de lançamento Saturn V, aos Módulos de Comando e Serviço e finalmente aos Módulos Lunares - uma enorme quantidade de componentes muito complicados tinha que funcionar corretamente para o sucesso da missão.
No início do programa, a NASA estabeleceu formalmente a meta de probabilidade de sucesso geral para cada missão da Apollo - um pouso e retorno - em 90%. A segurança geral da tripulação foi estimada em 99,9%. Mas uma avaliação feita em 1965 sobre esses riscos descobriu que, com base nos planos e tecnologias atuais, a probabilidade de sucesso da missão para cada voo era de apenas 73%, enquanto a segurança da tripulação por missão ficava em 96%.
Poucas pessoas viviam entre esses riscos e preocupações no dia-a-dia mais do que Robert Gilruth. Sua fama pode ter recuado nas últimas décadas, mas Gilruth ficou acima de todos os outros nos esforços da América para enviar humanos à Lua e fazê-los voltar sem problemas. Depois da criação da NASA, a nova agência havia recorrido a Gilruth para liderar o Grupo de Tarefa Espacial para colocar um humano no espaço antes da União Soviética. Mais tarde, depois que o presidente John F. Kennedy pediu a aterrissagem na Lua, essa tarefa coube ao Centro de Naves Espaciais tripuladas em Houston, que Gilruth dirigia.
Engenheiro aeronáutico de uma pequena cidade em Minnesota, Gilruth tinha uma visão mais pragmática do voo espacial humano do que a grande visão de Kennedy. Como ele viu, depois que a NASA pôs os astronautas em órbita com sucesso com o programa Mercury, o próximo passo lógico em direção a uma presença permanente no espaço teria sido construir uma estação espacial lá.
"Mas isso não tinha o chamariz que era necessário na época, aos olhos de Kennedy", recordou Gilruth, que morreu em 2000, em entrevista. "Ele pensou que ir para a Lua era o máximo possível para nós. Acho que o LBJ [presidente Lyndon Baines Johnson, sucessor de Kennedy] pensava assim também. Ninguém na NASA diria que eles estavam errados. Eu pelo menos disse que "não tenho certeza se podemos fazer isso, mas não tenho certeza se não podemos".
Gilruth não tinha ilusões sobre o desafio de alcançar a Lua. Além disso, assim que Neil Armstrong e Buzz Aldrin pisaram na Lua diante de uma audiência televisiva global, a NASA cumpria a ordem de Kennedy. Se cada missão tivesse uma chance de um quarto de não aterrissar na Lua e uma chance não desprezível de perder uma tripulação, por que continuar nela? Esse sentimento só cresceu dentro de Gilruth quando a NASA realizou mais aterrissagens lunares.
"Eu endireitei minha coluna e disse: 'Precisamos parar'", disse Gilruth. "Há tantas chances de perdermos uma equipe. Só vamos descobrir isso se continuarmos."
Apollo 12
Uma dessas chances aconteceu no segundo voo para a superfície lunar, no final de 1969. Uma frente fria varreu a península da Flórida em 12 de novembro, quando o foguete Apollo 12 foi abastecido sob um céu chuvoso e agourento. Mas nenhuma tempestade ativa ameaçou a barra de lançamento, então a contagem regressiva da missão prosseguiu conforme o planejado. Parte da razão pode ter sido que o presidente Richard Nixon estava olhando de perto.
O que ninguém percebeu, no entanto, é que o perigo espreitava nas nuvens. De cerca de 300 metros a 6 quilômetros de altura, mesmo que não estivessem produzindo raios, essas nuvens continham uma quantidade significativa de carga elétrica. Depois que o foguete foi lançado, com apenas 36,5 segundos de voo, um raio atingiu o veículo de lançamento, e novamente 15 segundos depois. Cada descarga continha cerca de 10.000 amperes de corrente em seu pico.
Uma análise pós-lançamento determinou que o Saturn V havia dado início aos raios nas nuvens eletrificadas. Isso ocorre porque a aceleração do booster e seu rastro de resíduos ionizados deixados no caminho fizeram um túnel de condução elétrica pela atmosfera. Foi esse campo elétrico aprimorado pelo foguete que desencadeou as descargas de raios.
Mas ninguém no foguete ou no Controle da Missão percebeu isso na hora. Os raios haviam "desmaiado" muitos dos sensores e instrumentos dentro do Módulo de Comando da Apollo, e a espaçonave começou a transmitir dados de telemetria sem sentido para o solo. Mais preocupante, o raio apagou a orientação e a plataforma de navegação cuidadosamente calibradas. Isso significava, no mínimo, que a tripulação teria que executar um demorado procedimento em órbita para recalibrá-lo.
Logo após as descargas elétricas, o comandante da missão, Pete Conrad Jr., ligou para Houston. "Ok, acabamos de perder a plataforma, galera", disse ele. "Eu não sei o que aconteceu aqui; mas nós temos tudo no mundo para desistir".
No Controle da Missão, Gerry Griffin estava controlando seu primeiro voo há apenas 1 minuto, e agora já enfrentava uma chamada de emergência. Ele deveria ordenar que abortassem? Ele tinha apenas alguns segundos para decidir. O que aconteceu em seguida acabou se tornando um momento lendário na história da NASA.
Uma das mentes mais brilhantes do Controle da Missão, John Aaron, sentou-se no console do Electrical, Environmental and Consumables Manager (EECOM - ou Gerência de Itens Elétricos, Ambientais e de Consumo, em uma tradução livre) naquele dia. A partir de simulações, Aaron lembrou ter visto um padrão semelhante de dados de telemetria sem sentido quando a fonte de alimentação de uma peça de hardware dentro do Módulo de Comando chamada "Signal Conditioning Equipment" (SCE, ou Equipamento Condicional de Sinal) falhou. Aaron deduziu que a troca desta caixa SCE para o seu modo de backup a traria de volta on-line e começaria a transmitir os dados de telemetria corretos para o solo. A partir disso, os controladores de voo deveriam ser capazes de determinar se a tripulação da Apollo 12 estava voando em uma bomba relógio ou não.
"Tente SCE para Aux", disse Aaron. Embora Griffin não tenha entendido muito bem o significado dessa mensagem, ele confiou em seu controlador de vôo. A mensagem foi transmitida para a espaçonave pela CAPCOM, que estava sendo dirigida pelo astronauta Gerald Carr.
"FCE para Aux?" Conrad respondeu. "Que diabo é isso?"
"SCE, SCE para auxiliar", Carr disse-lhe novamente.
Alan Bean, sentado ao lado de Conrad, reconheceu o comando e ligou o interruptor. Quase imediatamente, a energia voltou aos sistemas dentro da espaçonave. O controle da missão começou a receber bons dados de telemetria. Griffin instruiu a tripulação para continuar seu voo em órbita. Alguns dias depois, a NASA pousou em segurança na Lua pela segunda vez. (Este incidente é dramatizado fielmente na minissérie da HBO From the Earth to the Moon).
Além disso, o raio acabou validando um dos aspectos do design da NASA: já que o Saturn V tinha sido imaginado como um dia transportando carga, além de seres humanos, o foguete foi projetado com seu próprio sistema de orientação independente daquele fora usado durante o lançamento. Embora o relâmpago tivesse redefinido a plataforma de orientação do Módulo de Comando, os sistemas internos do Saturn V não estavam danificados e mantinham o foguete solidamente no rumo. Se o booster não tivesse sua própria orientação e dependesse dos computadores do comando da missão, as coisas teriam sido muito diferentes - teria sido um lançamento abortado na melhor das hipóteses. Na pior das hipóteses, a tripulação poderia ter sido morta.
Após a missão e a investigação subsequente, a NASA alterou algumas das regras de lançamento. Os foguetes não poderiam mais lançar-se dentro de 8 quilômetros de nuvens de trovoada ou 5 quilômetros de cumulonimbus incus. Eles não podiam lançar através de camadas de nuvens intermediárias a 1.8 km ou mais de profundidade, onde as nuvens estão congeladas, nem através de nuvens cumulus com altura de mais de 3 quilômetros ou mais.
Talvez, pensavam os diretores, a NASA tivesse passado por sua maior adversidade no programa Apollo e, respondendo admiravelmente em um momento de pressão, a tripulação e o Controle da Missão haviam provado sua coragem. Mas, como se veria depois, a NASA teria azar em breve. A agência espacial mal havia começado a adentrar nas profundezas das habilidades dos seus controladores de voo.
Pior cenário
Todo mundo conhece a história: a Apollo 13 era uma missão de rotina sem incidentes com um baixo nível de interesse público - até que algo explodiu e a "rotina" foi lançada pela janela. As coisas correram mal e não deveriam dar errado, mas o raciocínio rápido de Chris Kraft salvou o dia.
E deixando de lado nuances e detalhes, a explosão que danificou o Módulo de Comando e Serviço da Apollo 13 realmente teve uma causa relativamente direta: foi desencadeada por uma faísca dentro de um tanque de oxigênio supercrítico danificado. Fácil, certo?
Como tantas vezes acontece com problemas na vida real versus problemas nos filmes, investigar o "porquê" da explosão do tanque revela uma sequência de erros e descuidos que remontam a anos antes do lançamento da Apollo 13 da Pad 39. O contratado responsável pela construção do tanque e testes detêm alguma parte da culpa; Engenheiros da NASA contribuíram com sua parte; até mesmo a tripulação da Apollo 13 teve um papel a desempenhar na causa.
No final, a explosão ocorreu por causa de uma confusa cadeia de acontecimentos ao acaso que deram errado. Surgiu de atos de improvisação errados e de documentação incorreta (ou incorretamente interpretada). Em última análise, foi um problema causado por humanos e não um problema de design - embora muitos projetos tenham sido alterados após o Apollo 13 para minimizar o impacto de um possível evento recorrente. Ninguém como a NASA para consertar as portas do celeiro depois que os cavalos já escaparam.
A causa, parte um: O tanque arrancado
O problemático tanque de oxigênio líquido era o "tanque número dois", o segundo de dois tanques esféricos de oxígênio líquido (ou LOX) alojados no módulo de serviço da espaçonave. A principal fonte de energia da Apollo eram três grandes células de combustível, que geravam eletricidade e água (para a tripulação beber e resfriar os sistemas da espaçonave), combinando oxigênio líquido e hidrogênio líquido em uma reação eletroquímica; Ambos os tanques LOX foram canalizados para as três células de combustível.
Mas o tanque número dois começou a vida atribuído não ao Odyssey (módulo de comando lunar da Apollo 13), mas ao Charlie Brown (módulo de comando lunar da Apollo 10). Durante o período que antecedeu a Apollo 10 em 1968, descobriu-se que o tanque não estava bem encaixado no compartimento de equipamentos da Charlie Brown, então a decisão foi feita para trocar o tanque número dois por seu gêmeo da Odyssey em construção. Mas durante o procedimento de remoção, a equipe de terra não conseguiu desconectar um único parafuso de retenção, o que levou à queda do conjunto do tanque de uma altura de cerca de 5 centímetros. A queda aconteceu de tal maneira que alguns dos encanamentos internos ficaram desalinhados.
A NASA realizou uma inspeção e avaliação do tanque e determinou incorretamente que a probabilidade de danos causados pela queda era baixa. Parecia que a linha de abastecimento do tanque - usada principalmente durante o teste de solo e o check-out - havia sido arrancada da conexão, mas a linha de preenchimento não foi usada durante o voo e o desalinhamento não teve impacto potencial na missão.
A causa, parte dois: A fervida que deu errado
O tanque permaneceu intocado por dois anos, até março de 1970, quando a espaçonave Apollo 13 estava sendo testada. O teste envolveu encher a espaçonave com todos os seus criogênicos e verificar se tudo funcionava durante uma contagem regressiva simulada para ser lançada. O teste saiu sem incidentes e o tanque dois foi executado como deveria.
No entanto, quando chegou a hora de remover o tanque, a equipe de terra descobriu que a linha de preenchimento danificada estava interferindo no procedimento. O método usual de remover um tanque de LOX era enchê-lo de oxigênio gasoso através da linha de preenchimento, o que o faria ser deslocado. Mas dessa vez os técnicos não conseguiam fazer o procedimento funcionar por causa do dano na linha de preenchimento.
Em um procedimento alternativo assinado e aprovado pelo comandante da Apollo 13, Jim Lovell, a equipe de terra tentou esvaziar o tanque, evaporando o oxigênio líquido ao invés de drená-lo. Isso envolvia conectar o aquecedor do tanque à energia do solo e aumentar sua temperatura interna para cerca de 27 graus Celsius. A ideia era que a equipe de terra abrisse a linha de drenagem do tanque, acionasse o aquecedor e deixasse a LOX aquecida evaporar lentamente ao longo de dois dias.
No entanto, houve um problema com este plano.
O contratado responsável pela construção e check-out do tanque foi a Beechcraft (antigamente chamada de Beech Aircraft Corporation). Quando a Beechcraft originalmente desembarcou seu subcontrato da Apollo, as especificações que lhe foram dadas para construir tanques exigiam que esses tanques funcionassem com 28 volts de corrente contínua, que é o que os tanques receberiam dos sistemas de energia a bordo da Apollo.
A NASA posteriormente alterou essas especificações para exigir que os tanques também funcionassem em 65 volts de corrente contínua, de modo que equipamentos de terra de alta tensão pudessem ser usados para um enchimento e testes mais rápidos.
A Beech construiu os tanques e subcontratou os interruptores elétricos de outro fabricante. Mas por razões que permanecem incertas - mas que provavelmente se resumem a um fracasso honesto de supervisão em um projeto com um grande número de peças móveis - a Beech nunca informou ao seu subcontratado sobre a mudança na especificação de tensão, nem reformulou os tanques existentes para receberem uma tensão mais potente.
A causa, parte três: O aquecedor
Quando o tanque dois foi conectado a uma fonte de energia de 65 volts, a corrente fez com que as chaves de segurança termostáticas com classificação de apenas 28 volts se fechadas, permitindo que a energia fluísse sem impedimento para o aquecedor do tanque. A corrente mais alta e a falta de um interruptor "desligado" fizeram com que o aquecedor ultrapassasse bastante a temperatura desejada. Mas, mesmo com a temperatura no tanque subindo, os técnicos de solo ainda poderiam ter conseguido identificar o problema e salvar o dia, se não fosse por outro descuido: o termômetro do tanque não era capaz de exibir temperaturas acima de 85 graus Fahrenheit (cerca de 30 graus Celsius).
Os técnicos que assistiram ao teste estavam cientes apenas de que precisavam se certificar de que a temperatura não subia acima de 20 graus Celsius, e foi isso que o medidor de temperatura mostrou. Eles não sabiam que o medidor não exibia um valor mais alto.
Em vez de ligar e desligar o ciclo por meio da ação de seus interruptores termostáticos de segurança para manter uma temperatura confortável de 27 graus Celsius, o aquecedor do tanque dois permaneceu ligado recebendo 65 volts sem parar. A temperatura interna do tanque subiu para cerca de 540 graus Celsius e assim ficou por cerca de oito horas. O calor era tão extremo que entortou e quebrou o isolamento de Teflon ao redor da fiação interna do tanque, provavelmente expondo o metal nu em vários lugares.
O palco está montado
No filme Apollo 13, este é um momento dramático: Kevin Bacon aciona um interruptor, faíscas voam e gás é disparado em todos os lugares, e Tom Hanks fala uma das frases mais famosas da história do cinema (o comandante da missão Jim Lovell disse: "Houston, nós tivemos um problema").
A romantização nunca retrata o que acontece na realidade, mas desta vez, Hollywood chegou muito perto. Cerca de 56 horas sem incidentes no voo, o Piloto do Módulo de Comando Jack Swigert estava realizando um conjunto de tarefas rotineiras de limpeza na Odyssey. Uma dessas tarefas era chamada de "cryo stir", um procedimento que envolvia ativar brevemente os ventiladores dentro dos tanques de combustível criogênicos, a fim de desestratificar os materiais supercríticos para que os sensores dos tanques pudessem julgar com mais precisão a capacidade dos tanques.
Mas o dano no tanque dois garantiu que a rotina estava prestes a se tornar qualquer coisa, menos a desejada limpeza de rotina. A agitação criogênica fez com que algo acontecesse com a fiação danificada do tanque dois - uma mudança na resistência, ou uma mudança na posição, ou algum outro evento desencadeador - e a fiação acendeu.
O Teflon é, em circunstâncias normais, obstinadamente não-reativo - de fato, sua recusa total em pegar fogo é uma das coisas que o torna um excelente isolante para envolver os fios. No entanto, como é o caso da maioria dos materiais, o Teflon se comporta de maneira muito diferente sob alta pressão e quando está imerso em oxigênio supercrítico. Em vez de ser seguro e não inflamável, ele queima.
A faísca acendeu o isolamento de Teflon do fio (e, provavelmente, o metal do próprio fio). A combustão assolou o tanque por cerca de 16 segundos, fazendo com que a pressão do tanque subisse para mais de 6.000 psi [uma unidade de medida que afere a pressão de ambientes. A nossa atmosfera tem 14.69 psi, por exemplo]. Essa sobrepressão maciça comprometeu a estrutura do tanque e explodiu seu domo, o que por sua vez causou efeitos secundários de choque mecânico por toda a espaçonave (incluindo o fechamento das válvulas reagentes para duas das três células de combustível). Ao longo dos próximos quatro segundos, a combustão e seus gases se espalharam pelo compartimento de equipamentos do módulo de serviço, alimentando-se de mais Teflon e agora também isolamento de Mylar. A pressão acabou ficando tão grande que um dos painéis laterais do módulo de serviço explodiu, expondo o fogo ao espaço.
O vácuo rapidamente interrompeu a combustão, mas o estrago já havia sido feito: a Odyssey foi destruída e a sua capacidade de gerar energia efetivamente desapareceu. Os controladores de voo tiveram que lidar com uma missão completamente impensada - rapidamente se tornou aparente para eles, como ficou claro para o piloto do módulo lunar Fred Haise, que pousar na Lua não era mais uma possibilidade. A princípio, confusos com uma sequência supostamente impossível de fracassos, os controladores perseguiram a possibilidade de que o problema estivesse com sua instrumentação - embora a Apollo fosse o que de mais moderno havia na época, o equipamento ainda era propenso a problemas, e a instrumentação era geralmente suspeita de ser a causa da maioria das adversidades, a menos que se prove o contrário.
Mas como a situação evoluiu ao longo da primeira hora, tornou-se extremamente óbvio que o problema era real, muito real.
Quis custodiet?
É importante aqui fazer uma pausa e explicar a divisão do trabalho entre a tripulação na espaçonave e os controladores de voo no solo. Quando os primeiros voos Mercury da NASA ainda estavam na prancheta, um subconjunto de engenheiros do novíssimo Space Task Grpup (ou Grupo de Tarefa Espacial) - ele próprio um desdobramento da agência civil NACA, que em 1958 se viu subitamente repaginada como NASA - foram os responsáveis por desenvolver - a partir do nada - o conjunto de procedimentos e regras que regem um lançamento espacial e como ele pode ser controlado e gerenciado. Seus esforços para mapear todas as perguntas sobre "quem faz o quê" e "quando eles fazem isso" resultaram no que consideramos a visão clássica de "Controle da Missão".
A razão para esses consoles extravagantes se resumia ao fato de que, muito cedo, os projetistas do Space Task Group (chefiados pelo jovem Chris Kraft) perceberam que as espaçonaves que estavam construindo eram muito complicadas. O critério de seleção dos astronautas significava que as pessoas escolhidas para pilotar a espaçonave eram todos pilotos experientes com reflexos da velocidade da luz e capacidade de tomar decisões complexas muito rapidamente sob alto estresse, mas que eram ocupados demais para se dedicarem apenas a esse trabalho de voar. Se eles se deparassem com uma situação que exigisse profundo conhecimento de engenharia, além da habilidade de manobrar e acelerar, eles poderiam nem ser capazes de descrever adequadamente seus problemas antes de serem feridos ou mortos - a espaçonave Apollo simplesmente tinha muita coisa acontecendo para que a tripulação pudesse manter o controle.
Então, por necessidade, vigiar toda a enorme lista de sistemas complexos de uma espaçonave era uma tarefa dada ao solo, onde dezenas e dezenas de pares de olhos podiam se debruçar sobre enormes quantidades de detalhes sobre cada sistema. Os próprios astronautas poderiam então desfrutar de uma visão muito mais limitada dos componentes internos da espaçonave e poderiam se concentrar em mais tarefas apropriadas para os astronautas, como voar, encontrar o local indicado, ancorar, aterrissar e executar experimentos.
Quando tudo estava indo como deveria ser, todos os vários consoles no Controle da Missão - junto com a equipe de analistas e assistentes de cada controlador, que controlavam ainda mais sistemas - passavam o tempo observando o comportamento da espaçonave, mantendo o controle sobre a saúde de todos os seus componentes, rastreando seu vetor de estado (a posição, atitude e velocidade da espaçonave) e assegurando que a espaçonave estava em curso, atualizando continuamente um conjunto de procedimentos de abortar missão e trajetórias para uso se a espaçonave repentinamente retornasse à Terra, e garantindo que a missão estivesse seguindo seu cronograma cuidadosamente calculado.
Por outro lado, a tripulação tinha muito pouco conhecimento sobre o que sua nave estava fazendo. O desconcertante conjunto de instrumentação no cockpit da nave espacial Apollo lidava principalmente com orientação, controles do ambiente à sua volta, comunicações e sistemas elétricos - coisas que eles precisavam para serem capazes de solucionar problemas se estivessem fora de contato com o solo. O computador a bordo da Apollo poderia (através de um processo trabalhoso e propenso a erros de pressionamento manual de teclas) exibir muitas informações adicionais sobre a espaçonave - particularmente quando se tratava de orientação e tarefas de encontro - mas a tripulação não estava sobrecarregada com as centenas de telas de informações em milhares de sistemas que os controladores terrestres tinham que acompanhar.
Essas telas também não eram muito boas. As fileiras e colunas de figuras que os controladores observavam em seus consoles não eram imagens rasterizadas - em vez disso, eram imagens compostas borradas, geralmente geradas por uma câmera apontada para outra tela em outro lugar do prédio.
Detalhes estáticos, como rótulos de coluna e linha, foram criados interpondo um slide (como em um slide fotográfico com uma fotografia de verdade) entre uma tela cheia de números brutos e outra câmera e, em seguida, transmitindo essa imagem composta para a tela do controlador. Essa abordagem de camada sobre camada, acoplada a câmeras que operavam a partir de válvulas a vácuo da década de 1960, tornou os dados de rastreamento realmente difíceis.
Para evitar ter de procurar por um catálogo de centenas de "canais" de telas diferentes o tempo todo, os consoles dos controladores também estavam ligados a uma série estonteante de luzes de advertência específicas do sistema, cada uma das quais estava conectada a algum aspecto relevante do sistema da espaçonave. As luzes eram geralmente luzes com "limite de detecção", que podiam ser configuradas para acender quando algum valor do sistema ultrapassava um limite alto ou baixo pré-configurado. Os controladores foram treinados através de simulação exaustiva para saber qual "canal" de tela deveria ser consultado para detalhes com base em quais luzes estavam acesas.
Em 2012, durante uma visita à histórica sala de controle da Missão Apollo 2, o controlador de voo Seymour "Sy" Liebergot explicou as limitações do sistema:
"Nós lidaríamos com limites mais apertados do que os limites de falha, os limites superior e inferior, de um parâmetro", explicou Sy, em frente à sua mesa do EECOM e apontando para a linha de luzes de notificação de evento sobre os monitores duplos. "Nós os ajustamos um pouco mais para que pudéssemos ser alertados para uma mudança na nominal. Por exemplo, a pressão da cabine era de 5,0 [PSI]; se fosse para 5,5 ou para 4,7, seríamos alertados. "Esse tipo de desvio faria com que uma das luzes de sentido de limite se iluminasse, mostrando o sistema e o parâmetro que estava se comportando mal. O controlador saberia então qual página de exibição exibir nas telas do seu console."
"Nós poderíamos procurar o que era e então olharíamos para baixo na tela e teríamos um asterisco próximo a esse parâmetro", continuou ele. Este painel de notificação que direcionava os controladores para os problemas salvou-os de ter que varrer continuamente todas as telas de vídeo diferentes em seus monitores manualmente. O sistema foi refinado ainda mais depois da Apollo 13. "O que aconteceu lá foi que muita coisa falhou quase ao mesmo tempo", Sy continuou, "que era apenas uma grande falha em cascata e você simplesmente não podia dizer onde começou." Em resposta a isso, foram adicionados novos painéis de monitoramento de sistemas críticos que se acendiam se um parâmetro crítico se desviava e permanecia aceso, mesmo se o sistema retornasse ao intervalo normal - antes disso, as luzes de limite de detecção ficariam apagadas se o sistema parâmetros retornasse ao normal. Essa mudança foi crucial, pois, até a Apolo 14, quando as mudanças foram feitas, um problema transitório poderia passar despercebido se muitas outras coisas estivessem acontecendo ao mesmo tempo.
Isso, então, explica com facilidade um dos grandes problemas com o esforço inicial para diagnosticar a explosão da Apollo 13: com tantos problemas em cascata e tantos sistemas entrando e saindo de limites seguros, os controladores literalmente não conseguiam acompanhar tudo o que acontecia. Seus consoles nem mantiveram as luzes de problemas acesas depois que um sistema voltou aos seus limites normais. Também não havia uma maneira rápida de navegar por mais de um pequeno subconjunto de dados recentes. A telemetria estava sendo registrada de forma obediente em um rolo, mas tocá-la de volta envolvia muito trabalho físico para realmente puxar as bobinas e não era possível no meio da crise.
Então, quando um evento como a explosão da Apollo 13 aconteceu, foi difícil para os astronautas e controladores terrestres descobrirem o que diabos realmente estava acontecendo.
Inconcebível
A percepção comum do público sobre os eventos que se seguiram é fortemente influenciada pela dramatização da missão feita por Ron Howard em 1995. É um ótimo filme - somos grandes fãs aqui - mas as necessidades do meio e a exigência de encaixar a história em uma estrutura de filme típica significam que o filme é uma mistura de fatos, mais ou menos fatos e uma confabulação conveniente ao que se está querendo contar. Muitas das batidas dramáticas do filme (como a construção do filtro) são mostradas fora da ordem em que os eventos realmente aconteceram; muitos outros (como os astronautas gritando uns com os outros na cápsula) são simplesmente inventados. A vida não é um filme, e os eventos reais raramente se dividem em três atos estruturados.
Ainda assim, com as dramatizações, a Apollo 13 ficou muito mais próxima da verdade do que da ficção - especialmente o tom e a atitude dos controladores em campo lutando para salvar a tripulação.
Mesmo na primeira hora, quando os problemas se acumulavam em cima de problemas, era inconcebível para as pessoas no Controle da Missão que a equipe não chegasse em casa. Eles podem voltar para casa exaustos, desidratados e famintos, mas não chegarem em casa? A possibilidade não entrava seriamente na mente de ninguém, porque mesmo que a espaçonave exibisse falhas muito além de qualquer simulação, sempre havia mais coisas que podiam ser tentadas.
Um desses controladores foi Sy Liebergot, interpretado no filme pelo irmão de Ron Howard, Clint. Liebergot trabalhava no console do EECOM, onde era responsável por monitorar o equipamento elétrico, ambiental e de comunicações (ou consumíveis, dependendo da ordem da sigla que você prefira) no Módulo de Comando (uma posição semelhante, mas separada, chamada TELMU, para monitorar o Módulo Lunar). Liebergot estava chegando ao final de seu turno quando o acidente ocorreu, e ele testemunhou a explosão não como um único evento dramático, mas como uma torrente de sinais: leituras confusas e conflitantes em suas telas, o banco de luzes de status que adornavam a "sobrancelha" de seu console, uma mistura de várias conversas acontecendo ao mesmo tempo entre sua equipe de bastidores (com sua visão mais profunda dos sistemas da espaçonave) e o diretor de voo Gene Kranz, que estava em busca de algum tipo de informação do que estava ocorrendo.
A chave para o sucesso final de Apolo poderia ser resumida de maneira inteligente no lema dos Escoteiros: "Esteja preparado". Os controladores e as equipes treinaram exaustivamente para cada missão, separadamente e juntos em "simulações integradas" massivamente complexas, que conectavam centenas de pessoas em Cabo Canaveral e Houston (juntamente com outros centros da NASA e locais de apoio terceirizados) em uma enorme simulação do que todo mundo faria durante uma missão real.
Os técnicos de simulação, sob a tutela de supervisores ("SimSups") como Dick Koos e Bob Holkan, tinham uma alegria perversa em matar as equipes criativamente e punir controladores, mas sempre havia uma regra inquebrável em todas as simulações: tinha que haver uma maneira de ganhar. Em nenhum momento os supervisores de simulação foram autorizados a introduzir um cenário sem saída. Mesmo quando as simulações estavam em sua pior loucura das falhas quádruplas, nunca houve um momento Kobayashi Maru [uma espaçonave fictícia, usada em um simulador para treinamento de capitães na série Star Trek]. Isso por uma variedade de razões, mas o mais importante era que não havia valor em treinar para o fracasso - o etos do controlador de voo era tal que a falha, notoriamente, não era uma opção.
Este nível brutal de treinamento muitas vezes fez com que todos chegassem aos seus limites mentais, físicos e emocionais, mas resultou em um grupo de profissionais com um nível incomparável de familiaridade com seus sistemas e suas naves espaciais - a tal ponto que os melhores controladores, como John "SCE para AUX" Aaron, poderia pinçar da memória os sintomas variados que emergiriam das falhas de portais de transístores individuais na espaçonave.No entanto, esse nível de preparação profunda e familiaridade técnica íntima teve uma desvantagem enorme: condicionou os controladores a analisar primeiro os próprios sistemas como a causa de qualquer problema potencial que surgisse. Quando o tanque O2 da Odyssey explodiu, os controladores passaram mais tempo do que deveriam sob a suposição de que o problema estava relacionado à instrumentação, e não à possibilidade de um evento físico. Afinal de contas, "vamos explodir a espaçonave e ver como eles lidam com ela" foi vetado em simulações - sempre tinha que haver uma saída, por mais que estivesse ociosamente escondida, poderia estar sob camadas de má orientação.
Com isso em mente, quando pressionada por Kranz para obter informações, a primeira resposta de Liebergot foi um tanto previsível: "Podemos ter um problema de instrumentação, o FLIGHT".
Falando ao IEEE Spectrum em 2005, Liebergot conta a história com vergonha: "Era a diminuição do programa espacial tripulado. Eu nunca vivi isso."
Hype versus realidade
Como em qualquer crise do mundo real, não há maneira fácil e rápida de apresentar a linha de eventos imediatamente após a explosão - várias linhas de investigação estavam acontecendo simultaneamente, com várias vozes gritando por atenção no ouvido do Diretor de Voo Kranz. Cerca de uma hora após a explosão, quando estava ficando mais claro o que havia acontecido, o Controle da Missão passou por uma mudança de turno e Glynn Lunney substituiu Kranz na cadeira grande. Lunney vinha monitorando a situação pela última hora e estava se comunicando com Kranz por toda parte. A crise se desdobrou em uma estranha combinação de súbita queda de carros e deliberada lentidão.
"Um tipo de alvorada estava acontecendo", explicou Lunney em Apollo: The Race to the Moon. "Gene resolveu o problema com os caras e eu fiquei lá sentado e escutei ... Não era uma coisa que você soubesse imediatamente, 'Rapaz, nós estragamos os tanques e temos que recuperar essa coisa da Lua e ligar o [Módulo Lunar]. "Na verdade, foi uma série de revelações, apoiadas por dados, que apontavam para um curso de ação.
Ainda assim, considerando a duração total da crise e o tempo gasto com o controle dos problemas, as principais decisões sobre como levar a tripulação para casa foram feitas com uma rapidez quase impressionante. Liebergot compartilhou conosco um slide de uma apresentação que ele faz sobre a tomada de decisões em situações de crise, mostrando que quase todas as principais decisões vitais aconteceram em cerca de seis horas após a explosão:
Famoso, Liebergot minimiza suas contribuições para o gerenciamento imediato da crise. "A única coisa que fiz foi não me levantar e fugir!" ele disse. Pouco menos de duas horas após a explosão inicial, a tripulação começou a energizar o Módulo Lunar na direção do Controle em Terra, com a intenção de usá-lo como um bote salva-vidas - uma eventualidade que havia sido examinada com profundidade durante o treinamento da Apollo 10. A NASA descartou a ideia como impraticável, mas, da maneira típica da NASA, os engenheiros e controladores de voo criaram conjuntos de procedimentos para a eventualidade. Esses procedimentos foram localizados e colocados em serviço. Enquanto isso acontecia, havia dois imperativos que os controladores e a equipe tinham que trabalhar. O primeiro era manter intactas as reservas de oxigênio do módulo de comando, porque essas reservas eram necessárias para a reentrada. Embora o módulo de serviço mantivesse os principais tanques de oxigênio da missão, o MC tinha um pequeno tanque de oxigênio e um trio de garrafas de oxigênio de emergência ainda menores; Liebergot fez uma válvula de escape e isolou-as assim que ficou claro que a última célula de combustível as estava drenando para se manter gerando energia. "Nunca me ocorreu que perderíamos essa equipe", disse Liebergot. "Então eu estava tentando salvar o oxigênio para a reentrada." O segundo imperativo, porém, era manter a mesma célula de combustível de drenagem de oxigênio em funcionamento por tempo suficiente para ativar o Módulo Lunar - normalmente um processo metódico que leva várias horas e envolve centenas de etapas. A necessidade de desligar o Módulo de Comando o mais rápido possível criou um problema de galinha e ovo, porque acima de tudo o módulo lunar precisava obter seu vetor de estado inicial do computador do módulo de comando para que seus sistemas de propulsão e orientação soubessem onde a espaçonave estava e assim poder ser usada para levar a tripulação para casa. Liebergot explicou que, quando seu colega John Aaron entrou no turno, ele imediatamente reconheceu o problema em questão. "Quando John chegou, ele disse que precisamos de mais tempo para ligar o módulo lunar. Nós não vamos ter um problema de O2 - temos bastante oxigênio lá!" ele riu. Felizmente, o oxigênio restante no tanque um - junto com um empurrãozinho de uma das baterias de reentrada do módulo de comando - forneceu energia por tempo suficiente para que o ML ganhasse vida.
O Módulo Lunar foi abastecido com oxigênio mais que suficiente para os três tripulantes. Ele tinha uma quantidade enorme de material, na verdade, já que tinha que ser capaz de repressurizar completamente todo o seu volume interno com ar respirável várias vezes depois de ser esvaziado para que a tripulação pudesse fazer suas caminhadas em solo lunar. Em vez disso, a água tornou-se um problema premente.
Para economizar peso, o Módulo Lunar usava baterias em vez de células de combustível, e assim, em vez de ser capaz de fabricar água a partir de gases componentes como o módulo de serviço, ele tinha um suprimento fixo de material tanto para resfriamento quanto para consumo. Os controladores tinham que desligar o máximo de sistemas do ML para reduzir sua carga de calor e economizar água.
Ainda mais complicado, a equipe seguinte teve que descobrir uma maneira de deixar o computador de orientação do módulo lunar pilotar a espaçonave combinada Apollo + ML. Embora o módulo de comando e o lunar tivessem hardware quase idêntico ao computador de orientação Apollo , cada um deles executava softwares muito diferentes. Os parâmetros de voo no software do ML não estavam equipados para lidar com as mudanças no modelo de voo decorrentes do transporte de um módulo de comando e serviço - mudanças que incluíam um centro de massa muito distorcido. A solução exigia cálculos cuidadosos no solo para criar os parâmetros de queima apropriados, precedendo as manobras pré-planejadas programadas na memória do computador.
Os sistemas ambientais do ML não foram projetados para filtrar o ar de três astronautas por vários dias, e assim a tripulação teve que usar os lavadores de hidróxido de lítio do módulo de comando para isso (que trabalham pegando CO2 tóxico, removendo-os do ar e juntando-os para formar cristais de carbonato de lítio). Claro, física básica e um pouco mais de azar na jogada. Os depuradores do MC eram quadrados e não cabiam nos receptáculos dos cartuchos redondos do ML ("Diga-me que isto não é uma operação do governo", suspira o ator Ed Harris interpretando Gene Kranz em Apollo 13 quando contou esta notícia).
A questão foi tratada de uma maneira muito MacGyver. Engenheiros no chão construíram um dispositivo de "caixa de correio" com materiais que os astronautas da Apollo 13 tinham a bordo, então eles leram os procedimentos detalhados para a tripulação seguir e fazer sua própria cópia. O dispositivo permitiu que a tripulação da Apollo 13 utilizasse purificadores do módulo de comando, canalizando o ar dos receptáculos do ML através dos cartuchos quadrados mais volumosos. Se a tripulação não tivesse sido capaz de seguir exatamente os procedimentos, ou se o dispositivo resultante não tivesse funcionado direito, haveria outro procedimento de contingência para recorrer: a tripulação usaria a capacidade de lavagem de suas mochilas de Sistema Primário de Suporte à Vida dos trajes de missão fora da nave.
Mas funcionou. Depois disso, a única coisa a fazer era sentar e aguardar - e torcer para que os sistemas encharcados e condensados da Odyssey voltassem a funcionar quando chegasse a hora.
Audiência cativa
Para aqueles que assistiram ao drama se desdobrar na Terra, a Apollo 13 provou ser um assunto estressante. Ivy Hooks, a matemática que trabalhou em Houston durante o programa Apollo, mudou-se para o programa de ônibus espaciais em 1970. Durante a missão Apollo 13, ela havia viajado para o Langley Research Center, na Virgínia, para alguns testes de túnel de vento. Quando chegou ao hotel onde estava hospedada, Hooks ligou para o marido e ficou sabendo do acidente pela primeira vez.
"Eu era como 'Oh não, não, não, não'", disse ela. "Ele sabia o que eles tinham dito na TV, e isso era tudo o que ele sabia. Eu não sabia para quem ligar. Então lá eu sentei sozinha, em uma cidade que nunca tinha estado, e rezei a noite toda."
Acidente ou não, Hooks provavelmente não teria dormido muito naquela noite de qualquer maneira. Algum tipo de convenção tomara conta do hotel. Os corredores eram barulhentos durante a maior parte da noite.
"Na manhã seguinte, levantei-me e descobri que estava em um hotel cheio de padres católicos", lembrou Hooks. "Eu acho que se eu soubesse disso na noite anterior, eu teria me juntado a eles e colocado todos para orar. Era tão terrivelmente assustador. Nós não sabíamos muito, só o que estava na TV. Nós não tínhamos telefones celulares. Não havia Facebook. Não havia nada".
O drama do resgate da Apollo 13 conquistou a atenção do mundo numa época em que ir à Lua - por mais difícil que pareça hoje, quando as excursões lunares parecem exóticas - começou a se tornar um pouco chato para o público em geral. Estive lá, fiz isso. Mas este foi um drama real para as massas. O pouso da Apollo 13 na água, por exemplo, continua a ser a quinta transmissão de televisão mais assistida no Reino Unido de todos os tempos, superando até mesmo o casamento real do príncipe Charles e da princesa Diana em 1981. Desde então, o mundo nunca mais ficou tão fixado em único evento humano no espaço.
Voltando para casa
No espaço, depois que se amontoaram no módulo lunar e implementaram as modificações do controle da missão, a tripulação da Apollo 13 tirou o melhor de uma situação difícil com recursos limitados. Com o módulo de comando desligado, a equipe tinha uma fonte de alimentação no ML de pouco mais de 300 watts - o equivalente a algumas lâmpadas domésticas.
"Como você pode imaginar, ficou muito frio, porque não tínhamos cobertores térmicos suficientes para lidar com essa baixa potência", lembrou Haise. "Ele não congelou no ML, mas sim no MC. Os tanques de água estavam congelados mesmo quando os colocaram a bordo do porta-aviões."
Como não tinham acesso à água quente para tornar as refeições liofilizadas palatáveis, a equipe voltou-se para os lanches. Eles viviam de amendoim, cubos de biscoito e cubos de pão. Um dos poucos destaques da missão ocorreu durante a passagem lunar, quando a espaçonave chegou a 130 quilômetros da superfície lunar, e Haise, Lovell e Swigert se revezavam fotografando a Lua.
Todo o tempo, eles se preocuparam com o módulo de comando e serviço, que não foi projetado para ser desligado e foi, essencialmente, colocado em um estado de congelamento por vários dias. Ninguém tinha certeza de que voltaria à vida e então estaria apto a transportar a tripulação através da atmosfera da Terra. "Essa foi uma das coisas que mais me preocupou", disse Haise. "Como o veículo nunca foi planejado para ser desligado, não havia nenhum procedimento para ligá-lo. Esse foi um dos problemas que as pessoas tiveram que trabalhar. Jim (Lovell) continuou atrás das respostas para levar o procedimento correto até nós."
Mesmo que a tripulação tenha violado virtualmente todas as especificações para operar o Módulo de Comando, ele voltou à vida quando a espaçonave se aproximou da Terra. E apesar de seu frio prolongado, ele funcionou maravilhosamente - de todas as missões Apollo que voaram até a Lua, somente o Apollo 10 teve uma amerrissagem mais precisa. Todos e tudo, desde os controladores até os astronautas e a própria espaçonave, tiveram um desempenho impressionante.
Depois de pousarem no calmo Pacífico, Haise relembra mergulhadores abrindo a escotilha da cápsula, porque, quando o fizeram, o ar gelado soprou para fora da cápsula. Logo, os marinheiros levaram a tripulação a bordo do porta-aviões Iwo Jima. Pisando na embarcação da Marinha, com sol nas costas, Haise não pôde deixar de sorrir. "Eu estava pensando, garoto, é ótimo estar aqui", disse ele.
De volta a Houston, os controladores de vôo desordenados pularam sua costumeira festa, um bacanal para desabafar e celebrar a realização de coisas ousadas. Todos estavam tão cansados que todos foram para casa. Eles reescalonaram a festa por duas semanas depois em um restaurante alemão em Dickinson, uma pequena cidade ao sul do centro espacial. A tripulação da Apollo 13 se tornou os únicos astronautas a participarem da festa de resgate da própria missão - um desfecho apropriado para o voo mais infame da NASA.
O texto acima pode ser acompanhado em um vídeo produzido também pelo site Ars Technica onde podem ser vistas entrevistas dos astronautas e de quem mais participou deste momento histórico (em inglês).