Não sei quando você está lendo este texto, mas publico ele em 14 de novembro de 2018, data de inauguração oficial do projeto Sirius, o maior e mais avançado projeto de ciências já feito no Brasil.
Resumidamente, o Sirius é um acelerador de partículas, totalmente brasileiro que fica na cidade de Campinas, mais precisamente nas dependências do Laboratório Nacional de Luz Síncroton, na própria Universidade de Campinas.
Após entrar em operação o acelerador será o mais potente do mundo em sua categoria e um dos mais avançados de todo o mundo, colocando o Brasil na liderança mundial de produção de luz síncrotron. Mas o que o luz síncrotron? Para que servirá o Sirius? Continue lendo.
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O maior projeto científico brasileiro
Não sei você, mas eu fico bem empolgado quando o Brasil - em meio a desmontes e enxugamento do orçamento para ciência e tecnologia - lança um projeto ambicioso na área; e bota ambicioso nisso. Pois foi o que ocorreu hoje, com a inauguração do Sirius, a nova fonte de luz síncrotron brasileira.
E antes de avançarmos na investigação, um "detalhe" que faz toda a diferença para a compreensão do que vem a seguir: O que é uma luz síncrotron afinal de contas?
Embora o nome seja difícil, a ideia geral é simples: Síncrotron é um tipo de radiação eletromagnética gerada quando partículas carregadas - elétrons - são aceleradas a velocidades próximas à velocidade da luz e depois tem sua trajetória desviada por campos magnéticos. Ao completar o processo (passo 4 abaixo) e saírem nas estações de pesquisa, a luz funciona como uma fotografia 3D daquilo que esteja sendo pesquisado e investigado, desde uma cadeia de proteínas até átomos de alguma outra coisa qualquer.
E se nesse momento veio em sua cabeça a imagem do LHC, o famoso acelerador de partículas instalado no Cern, na Suíça, que possui um túnel de mais de 26 quilômetros de circunferência e que foi responsável por encontrar o Bóson de Higgs. Se você pensou isso, só posso dizer uma coisa: Você está certíssimo.
A máquina brasileira capaz de controlar o movimento dos elétrons e produzir a luz síncrotron é gigantesca. É bem verdade que o acelerador brasileiro é mais humilde frente o primo europeu, medindo 518 metros de circunferência (e 68 mil metros quadrados de área construída), porém, nada lhe tira o título de maior e mais complexa infraestrutura científica já construída no país, além de ser a mais avançada fonte de luz síncrotron de 4ª geração do mundo.
No entorno da estrutura foi construída uma barreira de concreto que mede 1,5 metro de espessura e 3 metros de altura. A preocupação não é somente com as pessoas que moram ao redor e poderiam ser expostas à radiação caso não houvesse a proteção, mas também porque o Sirius é um sistema extremamente delicado (o feixe de elétron é 50 vezes mais fino do que um fio de cabelo) e qualquer mínima interferência poderia alterar os resultados.
Necessário pontuar aqui que o Brasil não é nenhum novato no assunto, pois há décadas dispomos da atual fonte de luz síncrotron, a UVX, instalada no mesmo Laboratório Nacional de Luz Síncroton e que, inclusive, faz investigações confiáveis e de grande estabilidade dentro de suas capacidades. Porém, o problema é que, como qualquer tecnologia, com o passar do tempo ela começou a ficar defasada e já não acompanha mais as necessidades científicas e tecnológicas dos pesquisadores.
Mas o que são essas necessidades? Para que serve um emissor de luz síncrotron? Confira no próximo subtópico.
Por que precisamos de um acelerador destes?
Com o Sirius teremos um brilho de luz até 1 bilhão de vezes maior do que com o anterior UVX, dependendo da frequência que estiver sendo utilizada para o teste em questão. Em termos práticos, agora a luz produzida poderá ser usada para estudar superfícies duras e densas em profundidade de até alguns centímetros, contra os micrometros do antigo acelerador brasileiro.
Os ganhos imediatos com isso são o estudo de aços e metais em geral, além de estudo de rochas, o que impacta diretamente no que sabemos e conhecemos sobre as bacias de petróleo do pré-sal, por exemplo, além de permitir o desenvolvimento de novas tecnologias de exploração de petróleo e gás natural e de novos materiais mais leves e eficientes.
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Além disso, diversos outros campos da ciência têm a ganhar.
Na saúde, por exemplo, as pesquisas feitas através do síncrotron permitem a identificação das estruturas intracelulares, que por sua vez é uma das principais etapas para a criação de novos remédios. Poderá vir de Campinas um importante passo a cura do câncer ou do Alzheimer; isso porque a luz pode ser usada para o desenvolvimento de nanopartículas irão diagnosticar e combater vírus e bactérias diversas.
Já na agricultura, a luz síncrotron pode ser usada para a criação de fertilizantes mais eficientes e mais baratos (e também menos agressivos); além de ser usada para fazer análise do solo.
As capacidades do síncrotron brasileiro foram pensadas para atender as necessidades dos pesquisadores brasileiros, como energias alternativas, agronegócio e ciências da saúde, por exemplo, mas não param por aí. Hoje o UVX realiza dezenas de pesquisas por dia para estudantes e pesquisadores do mundo todo; com o início das operações do Sirius o montante de cooperação internacional e a complexidade dos trabalhos tende a aumentar.
Quem aposta nisso é o físico paulista Antônio José Roque da Silva - responsável por coordenar a construção do acelerador. Além dos benefícios diretos, segundo ele o Sirius ajudará o Brasil a galgar um novo patamar em relação à produção dos seus pesquisadores. "O Brasil pode assumir a liderança na nova ciência que pode sair desse salto de qualidade inclusive com coisas que podemos ser os primeiros a fazer." O físico também diz que o acelerador atrairá alguns dos melhores grupos do mundo que operam nesse tipo de acelerador. "Será o vetor de internacionalização mais marcante da ciência brasileira".
Segundo os cientistas do projeto, o Sirius terá a capacidade de projetar matéria sob pressão equivalente àquela do núcleo de Júpiter - o maior e mais massivo planeta do sistema solar, sendo o primeiro acelerador de partículas do mundo com essa capacidade (atualmente só conseguimos simular a pressão do núcleo da Terra)
Ansioso pelos primeiros resultados? Eu também estou, mas infelizmente vamos ter que esperar um pouquinho mais. Apesar de ter sido inaugurado oficialmente hoje, o Sirius só começa a operar pesquisas a partir do segundo semestre de 2019, desde que o governo entregue todos os recursos prometidos, é claro. O custo, embora justificável por sua necessidade, faz jus à grandiosidade da obra: 1.8 bilhão de reais.
Para continuar a leitura: Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, BBC, Piauí
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