Se você reclama da sua velocidade de internet, então foque as orações de hoje antes de dormir, em apenas uma coisa: FIBRA ÓTICA NO BRASIL, aliás, na sua cidade, no seu bairro, na sua rua. Isto porque você vai precisar rezar muito, já que a tecnologia ainda engatinha por aqui. Enquanto no Japão as taxas de transmissão beiram a instantaneidade, por aqui buscamos um streaming que não caia. Mas sem querer ficar no discurso vazio e vitimista, vamos ver como que essa tecnologia surgiu, como funciona, seus benefícios e a quantas anda sua disponibilidade aqui no nosso país.
Para isso, retornemos até 1870, muito antes de Turing inventar o que resultaria no primeiro computador "moderno", onde, até aquele ano, todos pensavam que a luz era algo "indobrável", retilínea e constante até a eternidade. No entanto, John Tyndall, um físico britânico, provou o contrário em frente a uma plateia de observadores incrédulos da Royal Society, a academia real de ciências daquele império. Naquele momento um paradigma era quebrado, uma lei do universo se desmanchava perante os olhos daqueles nobres cientistas, no mesmo salão onde já estiveram nomes como Robert Boyle, Robert Hooke, Isaac Newton, Humphry Davy e tantos outros (a instituição fora fundada em 1660).
Atual sede da Royal Society
Através de uma lanterna dentro de um recipiente opaco e com água, ele provou que a luz podia sim, fazer curvas. O conhecimento, de tão avançado, à época, de nada serviu, somente voltando a ser discutido, quase 100 anos depois, em 1952.
Neste ano, Narinder Singh Kapany, outro físico, este, indiano, começou a estudar sobre as singularidades da reflexão total interna. O estudo fora desenvolvido em Londres (mesmo local onde Tyndall tinha surpreendido os colegas décadas antes) e fazia parte do seu doutorado em ótica.
O inventor nos dias de hoje
Explicando melhor o que ele estudava e o que buscava descobrir: Reflexão total - objeto de seu estudo - é como se chama um fenômeno ótico que ocorre na fronteira de dois meios transparentes, que podem ser, por exemplo, ar e água. Imagine o seguinte: um raio de luz vindo de um meio com alto índice de refração (a água) e que incide num meio com baixo índice de refração (o ar). Se o ângulo dessa incidência de luz for maior que um ângulo tido como limite, o raio se refletirá com o mesmo ângulo, do contrário, passará para o outro meio.
As pesquisas do indiano eram conduzidas em prismas, cilindros de vidro transparente, películas de vidro, etc. Resumindo: Ele buscava um material que tivesse o menor índice de refração (neste caso, a película), para, assim, conseguir algo que funcionasse como um espelho. O pulo do gato vem no momento em que quanto maior a diferença entra os índices de refração, menor o ângulo limite, dessa forma, toda a luz que entrasse seria refletida em todos os ângulos possíveis, e mais um detalhe: Para que tudo desse certo ele precisava "aprisionar" a luz ali dentro.
Aprisionada, ela só sairia pela outra extremidade, mesmo que o tubo fosse curvo, redondo, triangular, etc. A luz agiria sempre da mesma forma, realizando milhares de reflexões sucessivas, sempre com o mesmo ângulo. Estava formulada a teoria que resultaria na nossa internet ultrarrápida de hoje em dia.
Faltava só encontrar um material com as características refratárias do vidro e a maleabilidade de fios de cobre e depois estreitar estes canos de luz à dimensão de um fio de cabelo. O primeiro foi fácil de encontrar, já que as fibras de vidro eram nossas conhecidas desde o século XVIII e vinham sendo usadas como isolante térmico desde então. O resto veio com algumas adaptações na fabricação até chegar no estágio perfeito. Assim três anos depois do início das pesquisas, em 1955, o físico Narander Kapany cunhou a expressão fibra ótica e patenteou a invenção.
Hoje a produção da fibra ótica dá-se principalmente com a transformação da sílica, retirada de rochas de quartzo, em varetas ocas de sílica pura, ou ainda em vidro, nylon e até plástico (todos isolantes elétricos).
Mas para chegar ao uso comum, a tecnologia precisou de mais um agente, já que o pai da invenção enxergava utilidade para sua invenção apenas no campo da medicina e de seus instrumentos (pois agrupadas em feixes, as fibras podiam transmitir imagens melhor do que qualquer outro modo já testado pelo homem). Essa personagem foi outro físico, dessa vez um chinês: Charles Kao. Foi ele quem teve a ideia teve a de usar as fibras óticas para a transmissão de chamadas telefônicas. Ele conseguiu provar que os recém inventados cabos de fibras óticas, embora centenas de vezes menores que os cabos convencionais, tinham uma capacidade inversamente proporcional na transmissão de dados de voz, e por simetria, de televisão, computador, internet, etc. e tudo isso a um custo muito menor.
E como se não bastasse, a fibra ótica ainda dispõe de outras qualidades que a torna tão amada, como por exemplo: Sendo um cabo que não conduz eletricidade, está imune a qualquer espécie de interferência elétrica exterior; e outro: tem bem menos perda de sinal do que uma transmissão via cabo convencional, satélite, wireless, etc. ajudando também tanto na velocidade, como na integridade dos pacotes transmitidos.
Produzida desde os anos 60, a primeira rede telefônica com esta tecnologia foi inaugurada em 1973 nos Estados Unidos e desde então começou a se disseminar. 3 anos depois veio o primeiro link de tv a cabo, no Reino Unido, e em 1988 o primeiro cabo oceânico foi instalado, dando início à era da supervelocidade de informação.
Mas não é tão simples produzir um cabo de fibra ótica como pode parecer. Para se chegar ao resultado final, várias camadas de materiais e isolantes são integradas com cuidado para que tudo dê certo no final. Funciona assim: na parte externa vai uma camada de plástico (que deve obedecer às normas contra incêndio), logo abaixo uma camada de kevlar para proteger de impactos e dar robustez (mesmo material dos coletes à prova de balas e material sintético mais resistente já criado em laboratório), depois mais uma camada plástica também para proteção e robustez, por dentro vão fios de aço inoxidável para também dar maior robustez e por fim o tal fio de vidro, ou em outras palavras, a fibra ótica, mais fina do que um fio de cabelo. Dependendo do local onde o cabo será instalado, como no oceano, por exemplo, mais materiais podem "engrossar o caldo", como cobre, vaselina, policarbonato, etc.
Bom, pode parecer estranho pensarmos nisso, mas toda essa internet transmitida via fibra ótica, ou o sinal da tv a cabo, a telefonia, etc. são transmitidos em feixes de luz. Sim, os dados viram luz quando são emitidos, geralmente por meio de um diodo emissor de ou um tubo de raio laser. Sacou por que a transmissão neste método é tão rápido? Se você fez relação com a velocidade da luz, então acertou, ou está muito perto da verdade (se quiser mais explicações sobre a inimaginável velocidade da luz, clique no link à direita). Continuando: Controlando-se a emissão da luz (trabalho do diodo emissor de luz), é possível criar códigos digitais para transmitir informações, vulgarmente falando:criar uma linguagem binária, só que ao invés de 0 e 1, temos presença de luz e ausência de luz.
E falando em velocidade, prevê-se uma velocidade de até 1 giga por segundo, ou seja: se com uma internet de 1MB conseguimos um download de 1.2MB, a uma conexão de 1 GB conseguiríamos baixar a cerca de 120MB por segundo. Imaginou? Você baixaria um torrent de 5Gb de tamanho em menos de 1 minuto. Por meio de sua capacidade, a fibra ótica é capaz de transmitir até 20 mil conversas telefônicas simultâneas por cabo, nada mais, nada menos do que quarenta vezes a cifra de um fio de cobre convencional.
E não nos enganemos, além de melhorar extraordinariamente as telecomunicações, a tecnologia é usada também em uma variedade enorme de equipamentos, desde automóveis, mísseis, blindados, satélites, fiação de computadores, eletrodomésticos, em microeletrônica, engenharia genética, fotografia, decoração, etc. Diz-se, inclusive, que em um futuro não tão distante este tipo de malha vai, literalmente, substituir o hardware físico dos nossos computadores.
Fibra ótica usada como decoração de ambientes
E no Brasil?
No Brasil o primeiro cabo de fibra ótica foi puxado em 1977 na Unicamp - Universidade de Campinas - onde uma equipe de pesquisa, liderada por estudiosos que haviam participado das principais descobertas do ramo, nos EUA, na década passada, fizeram bons avanços no país. Pioneiros na área, não aproveitamos o potencial e deixamos o desenvolvimento para trás.
Hoje, temos cerca de 16 mil quilômetros ociosos de fibra ótica no país, que poderão ser, em breve, postos em funcionamento, novamente, com o Plano nacional de Banda Larga. A rede, que conecta as maiores capitais do país foi construída pela Eletronet, e, por causa de falência da empresa, foi tomada e embargada pela justiça (que já deu abertura para que seja utilizada novamente). O plano é juntar estes 16 mil km’s aos outros 5 mil, utilizados pelas estatais, como a Petrobras, melhorando nossa qualidade de conexão.
Esperemos então que isso não tarde a acontecer, porque eu já estou fazendo minha listinha de torrents aqui.