Diversas grandes empresas tentaram produzir veículos autônomos nos últimos anos, prometendo que essa inovação chegaria logo aos mercados. A Tesla recentemente anunciou que entregará carros totalmente autônomos até o fim de 2019 e robotáxis em 2020.
Porém, segundo um artigo publicado pela analista de tecnologia Beth Kindig, esse futuro está muito longe da nossa realidade. Para ela, existem inúmeros problemas acerca dessa tecnologia, que ela dividiu em cinco tópicos, os quais chamou de "verdades".
Primeira verdade: veículos assistidos e não autônomos
Beth Kindig divide em cinco níveis os veículos autônomos. Atualmente, estamos no nível 2 - em que o carro apenas auxilia nas funções de direção e aceleração - e não conseguimos passar disso. A Tesla não pode liberar recursos mais avançados que a Ford, Mercedes e BMW por exemplo.
No entanto, nos próximos dois ou três anos será possível avançar para o nível 3, chamado de "automação condicional": o veículo controla o monitoramento do ambiente usando sensores. A atenção do motorista é crítica, mas o sistema AV executa as funções de segurança. A atenção humana só é necessária acima de 37 milhas por hora.
Mesmo assim, até o momento (e nos próximos anos) ainda não será possível chamar os veículos de autônomos, uma vez que a atividade humana é e continuará sendo necessária.
Além disso, existem diversas regulamentações que impedem o lançamento de tecnologias nível 3 - foi o caso da Audi, que em janeiro de 2019 tentou lançar o Audi A8 Traffic Jam Assist, mas teve a divulgação adiada por "regulamentações federais não tão claras, diferenças de infraestrutura e baixo entendimento do consumidor sobre a tecnologia de veículos autônomos".
A autora então questiona como seria possível lançar um veículo nível 5 sem sequer ter vencido as barreiras burocráticas do nível 3?
Segunda verdade: sistema AV e coração 5G
Recentemente a Tesla realizou o Tesla Autonomy Day, uma conferência para investidores. Nela, prometeu que entregaria veículos autônomos até o final de 2019 e robotáxis até 2020.
Ao apresentar como funcionariam as máquinas em questão, a Tesla anunciou que utilizaria 4G ao invés do 5G, o que, para Beth Kindig "é estranho, para dizer o mínimo": o 4G não é rápido o suficiente para sensores em um veículo reagirem em milissegundos. Seria preciso capacidade de rede 5G para que as máquinas pensem com a mesma rapidez que seres humanos e consigam reagir em momentos críticos.
A diferença de velocidade entre as redes é de 40 milissegundos, o que pode significar muito na hora de frear durante uma situação de emergência.
Embora o 5G tenha sido implantado em apenas duas cidades (Chicago e Minneapolis) ele é necessário para a comercialização de veículos autônomos de uso pessoal. Uma das principais características do 5G é que o sinal de dispositivos conectados não precisa viajar até uma torre de celular para que os veículos recebam e mandem informações, o que aumenta a velocidade dessa troca.
Um dos motivos de companhias automotivas estarem adiando a implantação de suas tecnologias AV até 2022 é exatamente a espera pela disponibilidade 5G em mais locais. Mas mesmo assim, a criação de um veículo totalmente autônomo ainda enfrentará outros obstáculos, pois o 5G é uma tecnologia urbana e não rural - e a "robotaxia" implantada fora de áreas urbanas está ignorando diversos níveis e etapas cruciais.
Seja como for, para a autora, será muito mais provável nos depararmos com transportes públicos autônomos habilitados para 5G em áreas urbanas do que veículos de uso pessoal. A China pretende fazer isso até 2022, por exemplo.
Terceira verdade: "driveless" é proibidamente caro
Existem veículos que possuem todos seus dados a bordo e não precisam se comunicar com sensores ou com a nuvem para frear e responder a obstáculos. É o caso da empresa Caterpillar, que está operando maquinários sem motoristas (em áreas onde há poucos obstáculos desconhecidos). Porém, hoje em dia, a auto condução com recursos computacionais incorporados na máquina são extremamente caros para veículos que serão utilizados para fins pessoais (e para a maioria dos fins industriais também).
Isso fora o gasto de bateria para que o carro funcione sem nenhum auxílio externo: quanto mais computadores ou servidores no carro, menos será possível viajar, uma vez que a energia não será gasta apenas para locomoção, mas também para tomada de decisões.
Quarta verdade: pequena diferenciação hoje em dia
O Tesla’s Autonomy Day revelou que a Tesla construiu seu próprio chip AV e que pretende usar câmeras no lugar de sensores LIDAR.
O Waymo já tinha o hardware pronto há décadas e testou (junto do software) em aproximadamente 10 mil milhas, sempre com um humano para intervir quando necessário. O Waymo não vai implementar comercialmente o sistema AV tão cedo, uma vez que o AV apresentou algumas falhas (além de ser uma das partes mais difíceis do projeto).
Os carros autônomos lançados hoje contam com a potência de 20 computadores pessoais e mais de 100 milhões de linhas de programação. Na próxima década, espera-se que sejam 300 milhões de linhas. Já o futuro distante promete mais de 1 bilhão de linhas de programação - o desafio é o software, não o hardware.
Segurança é outra questão que precisa ser resolvida antes de sistemas AV serem comercializados para o público. Isso porque os componentes elétricos de um carro são conectados via internet. Esses componentes sofrem conflitos diretos com o sistema de entretenimento do veículo, o que significa que se conectar ao WiFi ou Bluetooth do carro pode afetar diretamente o freio e as transmissões.
Nesse quesito, a Qualcomm vem fazendo um trabalho interessante, lançando em 2017 o processador Qualcomm 9150 C-V2X. Inclusive, essa será a tecnologia usada pela China, que garante a segurança do motorista ao permitir que veículos e infraestrutura se comuniquem. O processador faz com que semáforos e faixas de pedestres se comuniquem com o veículo, no lugar de exigir da máquina o discernimento de situações como sinais fechados e pedestres atravessando a via.
Quinta verdade: líderes em veículos autônomos trabalham em conjunto pela segurança pública
Para a autora, companhias que estão desenvolvendo tecnologia AV estão sendo irresponsáveis se não estiverem trabalhando em conjunto pensando na segurança pública em primeiro lugar.
Apenas nos Estados Unidos ocorrem 6 milhões de acidentes com carros por ano. É muito arriscado lançar uma tecnologia que pode ter um impacto tão grande em um país se o foco for apenas o lucro.
No Consumer Eletronic Show (CES) 2019, um grupo denominado "Partners for Automated Vehicle Education" (Parceiros da Educação de Veículos Automatizados) foi formado. O objetivo é "trazer informações reais e factuais para o público e políticos, fazendo com que os consumidores entendam a tecnologia e seu potencial atual e futuro - incluindo os benefícios na segurança, mobilidade e sustentabilidade". O PAVE é formado por empresas como Audi, Daimler, General Motors, Toyota, Waymo, Volkswagen, Nvidia e Intel.
Fonte: Beth.technology