Não é novidade que a modernidade agravou transtornos psicológicos, dia a dia mais presentes nas novas gerações. Mas afinal, o que contribui para isso? Por que a atualidade, depressão e ansiedade estão tudo na mesma caixa? Evidentemente a tecnologia tem muito a ver com tudo isso.
O aspecto mais básico da tecnologia e a psicologia humana é como ela modifica nossa maneira de viver. O sistema capitalista incentivou por centenas de anos o desenvolvimento de novas tecnologias com o objetivo de aprimoramento de produtividade e maior dinamicidade entre as relações comerciais. Carros, trens, toda a revolução industrial possibilitou um aumento frenético do passo da vida humana. A velocidade é característica central da inovação, mas ao mesmo tempo em que a sociedade produz mais, em que a população cresce e a escala de tudo cresce, também cresce os objetivos e expectativas coletivas. Cada vez o ser humano precisou e precisa de mais para viver, resultando em mais trabalho, mais estudo, menos tempo livre e consequentemente na fragilização da saúde mental. O ritmo de vida em 2019 é um compilado de preocupações constantes, cobranças externas e internas enquanto se é bombardeado por informação em massa e relações humanas superficiais aos montes.
Certo, mas esse processo de aceleração da rotina e crescente cobrança não é de hoje, por que então os últimos vinte anos são recordes em depressão e ansiedade sobre a população majoritariamente urbana? Vendo esse background, adicionou-se o fator da conectividade e globalização. Dentro desse fator, há três características que afetam nosso psicológico profundamente:

1: A comparação e competitividade - As redes sociais possibilitaram a facilidade de comunicação e de relacionamento entre pessoas, o que é extremamente positivo. Entretanto, surgiram uma, duas, inúmeras redes sociais, cada um com um intuito diferente e com o fator comum de incentivar a exposição pessoal. Por si só, se expor, mostrar sua vida na internet não é prejudicial necessariamente, o que torna o compartilhamento de nossas vidas prejudicial para nossas mentes é justamente e superficialidade que assim geralmente o fazemos. A regra social é compartilhar com todos o que há de bom, suas viagens, comidas gostosas, celebrar o início de um relacionamento, trazer a criação de personagens alternativos a nós mesmos, nossos alter-egos digitais que não possuem problemas. Assim, fugimos da realidade complexa e repleta de coisas negativas para nos concentrar em criar e consumir conteúdo de contos de fadas. Porém, não são nossas versões digitais que vivem nossa vida, e tampouco que lidam com o que há de negativo. Mostramos o que há de bom, mas é inevitável olhar a grama do vizinho que sempre é mais verde, aquele amigo que começou a namorar enquanto você está solteiro, ou o familiar que realizou a viagem que você sempre quis fazer, ou amigos da mesma idade alcançando feitos extraordinários enquanto você nada fez. A comparação que fazemos não é por culpa nossa, é simplesmente automática, e isso sim fere nossa autoestima e nossa saúde mental. Lembro ainda que esse processo é constante, a maioria da população conectada faz isso diariamente, todos os dias da semana, na palma de sua mão.

3: A solidão em meio a relações humanas superficiais - Hoje temos 15 pessoas que convivemos no trabalho, outras 15 na academia, faculdade ou curso, além de nossa própria família e amigos mais próximos. Todos estão adicionados em nossas redes sociais juntamente com cada pessoa que já cruzou nosso caminho durante nossas vidas. Temos esses contatos no WhatsApp e participamos de inúmeros grupos de mensagens que mal conseguimos acompanhar. Hoje se criou um fenômeno social de relações humanas numerosas e cada vez mais superficiais. Tentamos interagir com o máximo de pessoas que pudermos, porque é assim que todos fazem na internet. Queremos aumentar nosso número de amizades no Facebook, ter muitas curtidas em fotos no Instagram e quanto mais interações, compartilhamentos e comentários em nossos conteúdos, mais nos sentimos relevantes. O problema está que mantemos essa fórmula e somos incapazes de criar vínculos profundos com tanta gente. Ao mesmo tempo que nos sentimos rodeados por amigos e conhecidos no âmbito digital, na vida real temos poucas pessoas para contar. E é privilegiado quem verdadeiramente pode contar com outras pessoas, porque em meio a tantas interações, nos conhecemos muito pouco para poder desabafar, falar de nossos problemas, ajudar e ser ajudado. Novamente, quando compartilhamos coisas boas, recebemos atenção, e quando compartilhamos algo ruim, recebemos menos ou nada. Em 2019 nos sentimos sozinhos com milhares de contatos digitais. A tecnologia não é de maneira alguma nossa inimiga, mas nós precisamos nos educar propriamente para essa era. Educar tanto tecnicamente, quanto (principalmente) emocionalmente para lidar com tantas transformações constantes. É completamente possível se manter mentalmente saudável hoje em dia, só não é fácil. Por isso precisamos falar sobre, precisa-se se discutir tanto esses transtornos quanto as causas dessas coisas. Quando precisamos de tratamento, tomamos medicação e fazemos terapia para tratar de nossos problemas individuais, nossos traumas, mas para além disso, a sociedade como um todo precisa de terapia justamente para identificar e tratar as causas e traumas do coletivo, impedindo o máximo possível a fragilização da saúde mental do humano moderno. O mundo não está parado, as redes sociais estão cientes desses problemas, tanto que o Facebook desativou a visibilidade do número de curtidas logo após o Instagram fazê-lo. É um começo e é um sinal de que nossa saúde mental está em pauta.